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BLOG DO MÁRIO

Neste blog eu posto de tudo um pouco, prezando sempre por assuntos que despertam interesse do leitor, evitando assuntos polêmicos como política, religião e futebol. Boa leitura! Eu sei que você vai curtir.

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11
Out08

Causos: Nossos queridos velhos

Mário Sérgio Figueredo

Recentemente o Motonline citou em uma matéria o conhecido “Tio Bel“, motociclista de Campina Grande (PB), que aos 95 anos ainda pilota uma possante Suzuki Hayabusa. Pois essa menção fez-me relembrar de uma história do meu passado, a qual compartilho com vocês.Tio Bel, ainda motociclista aos 95 anos

Tio Bel, ainda motociclista aos 95 anos

Nossa turma de motoqueiros (sim, éramos todos motoqueiros, ainda não existia essa distinção preconceituosa entre motoqueiro e motociclista) gostava muito de andar de moto num bairro aqui de Curitiba chamado Guabirotuba, que nos agradava por ter um relevo bem irregular, cheio de morros e consequentemente, subidas bem íngremes. Como o relevo obrigava as ruas a serpentear, num determinado lugar a prefeitura construiu uma grande escadaria de aproximadamente 100 metros, bem íngreme, que ligava a parte alta do bairro com a parte baixa, chegando a ter ângulos próximos a 35º.

Essa escadaria tinha nas suas bordas duas faixas de paralelepípedos, de 1 metro, planas e no centro os degraus. Fazíamos a festa subindo-a e descendo de moto,  inúmeras vezes e até arriscando a descer pelos degraus. Vivíamos lá nos divertindo.

Num desses passeios, resolvi ir do ponto alto da escada até a parte baixa, pela rua, que fazia um “U” bem longo. Iniciei meu trajeto e já na primeira perna do “U” vinha, em sentido contrário, uma brasília azul conduzida por um senhor septuagenário. Quando estávamos a poucos metros um do outro ele bruscamente cortou a minha frente, sem dar sinal, para entrar na sua garagem. Freei o que deu, mas como era descida acentuada, piso de paralelepípedo e pra piorar ainda mais havia areia que se desprende da junções das pedras, não deu outra. Entrei com tudo na porta do passageiro, me projetando sobre o carro.

Piloto americano anônimo de 88 anos

Piloto americano anônimo de 88 anos

Apesar de estar com o capacete fechado ainda bati com o queixo na canaleta do teto da Brasília, sofrendo um grande e profundo corte que precisou de alguns pontos e deixou-me uma bela cicatriz que me acompanha até hoje como recordação. Com a moto os estragos foram relevantes, entortando a roda e bengalas, além de inutilizar o pára-lama e quebrar o farol e pisca de um lado. Paramos, meu queixo já sangrava cântaros e o senhor veio me esculachar.

Incrível que mesmo tendo feito uma manobra totalmente irregular, ele ainda achava que estava certo. Como estávamos na frente da casa dele, apareceu filho, cunhado, tia, sobrinha, papagaio e até o cachorro de estimação da família. Fiquei mais de uma hora, segurando uma flanela amarela no queixo pra estancar o sangue, tentando convencer aquele senhor de que ele estava errado, sendo até ajudado por um dos seus filhos, mas ninguém conseguiu convencê-lo de que estava errado e a fazer algum tipo de acordo, e o jeito foi chamar o plantão de acidentes do Detran para registrar a ocorrência e dessa forma me garantir pra enfrentar as vias judiciais. Depois de toda essa burocracia é que fui até o pronto-socorro pra costurar meu queixo. Imagine o suplício pra quem tinha pavor de agulha de injeção.

Como será quando não mais podermos ir para a estrada relaxar?

Como será quando não mais podermos ir para a estrada relaxar?

Naquela época, uma vez registrada a ocorrência, era marcada uma data em que os condutores envolvidos no acidente eram convocados para participar do julgamento do acidente, que era realizado por uma comissão oficialmente designada pelo Detran. A comissão era constituída por 3 integrantes e funcionava como se fosse um tribunal, ou seja, a comissão num balcão mais elevado e as partes sentadas em cadeiras à frente desse balcão. Nessa sessão a comissão julgava o croquis e os relatos coletados pelo plantão de trânsito que atendeu à ocorrência, ouvia os condutores e na mesma sessão apontava o culpado pelo acidente, indicando quem teria o ônus do ressarcimento. Esse sistema era ótimo na época mas inviável nos dias de hoje devido ao número de ocorrências.

Após o julgamento, como esperado, aquele senhor foi apontado como causador do acidente, resultado que foi questionado veementemente. O senhor não se conformava e passou a ofender a comissão, acalmando-se somente após ser ameaçado de prisão por desacato. Mais calmo finalmente ele consentiu em ressarcir-me das despesas que tive pra consertar minha moto, fazendo dois cheques para 30 e 60 dias, que apesar da inflação galopante da época, considerei ainda um bom negócio pois consegui recuperar meu prejuízo quase totalmente. Depois disso, nunca mais o vi, apesar de continuarmos nossos passeios naquele bairro por muito tempo.

O que mais marcou desse episódio é que, a despeito de todos os fatos, aquele senhor em momento algum assumiu sua culpa. Notava-se que não havia má fé, mas que ele tinha certeza de que não havia feito nada de errado e até mesmo depois do julgamento e ressarcimento, ainda mantinha a convicção de que estava sendo injustiçado. Sua capacidade de julgamento o traia, não o deixara perceber que a sua visão havia falhado ao não ver a moto que trafegava em sentido contrário.

Mas o pior é que a sua capacidade de discernimento também estava falhando, provando que já havia passado da hora dele ter abandonado a condução de veículos. Aquela experiência foi determinante para convencer meu pai, que hoje tem 82 anos, a parar de dirigir, antes que as limitações impostas pela idade viessem a provocar algum acidente sério.

Quando será nossa hora de parar de pilotar?

Quando será nossa hora de parar de pilotar?

Há quase 7 anos que ele aposentou a CNH. O caso dele era crítico pois por morar numa praia de Santa Catarina, dirigia mais em estradas do que em trânsito urbano e por isso, qualquer acidente teria consequências mais sérias devido à velocidade mais elevada das rodovias. Claro que outras providências tiveram que ser tomadas. Trouxemos ele com minha mãe pra morarem na nossa cidade onde pudéssemos estar mais presentes e dar a eles um cuidado mais permanente e merecido.

Nós, filhos, temos a responsabilidade e a obrigação de proteger nossos velhos, intercedendo quando a situação exigir, coisa que a família daquele senhor da Brasília deixou de fazer no momento certo.

Daí, fico pensando que vai chegar um momento em que nossa visão fraquejará, nossos reflexos ficarão lentos e nosso senso de percepção não mais será confiável, determinando a hora de parar de dirigir e pilotar. Quando é que isso vai acontecer? E como será daquele momento em diante, tendo que nos conformar com a dolorosa privação de um dos maiores prazeres da vida – andar de moto?

Mas isso é coisa para o futuro, não vamos nos preocupar com isso agora. Não precisamos sofrer por antecipação.

By: Mário Sérgio Figueredo
 
 
Este texto já foi publicado no site moto.com.br e na ocasião recebeu alguns comentários, os quais transcrevo abaixo, além de e-mails emocionados e apaixonados de filhos relembrando seus pais que já se foram do nosso convívio.
 
Carlos Gama - Santos / São Paulo
postado em: 12/08/2008, 11:43:44
Excelente história, Mário Sérgio, tanto pelo aspecto da análise do comportamento da família, quanto pelo exemplo do que pode ocorrer quando a idade avança e não nos damos conta. Meu segundo emprego foi como instrutor de auto-escola (há mais de 40 anos) e, já naquela época eu defendia a necessidade de exames psicotécnicos e, até práticos, depois de uma certa idade. Hoje, aos 62 anos, continuo só viajando de motocicleta mas, na hora em que sentir que não dá mais eu paro. Parabéns pela matéria.
 
Adauto - São Paulo / São Paulo
postado em: 12/08/2008, 13:00:01
Concordo sim, que temos que ter cautela para dirigir um veiculo ou pilotar uma moto. Mais não sou nem um pouco a favor quando vc diz que pessoas de idade não podem mais dirigir. Mais cada um tem a sua opnião. Abraço
 
Leo - São Paulo / São Paulo
postado em: 12/08/2008, 14:48:30
Como sempre um texto digno de um livro de Cronicas. Mas hje meu comentário é para o Sr Carlos Gama de Santos. Muito bom o seu depoimento de que ainda usufrui de forma segura e prazeirosa das duas rodas com 62 anos. Deus queira q eu consiga chegar até lá assim. Muito incentivador!! Abraços a todos.
 
Mário Sérgio - Curitiba / Paraná
postado em: 12/08/2008, 15:36:31
Adauto, a hora de parar varia de pessoa a pessoa e não é a idade que determina isso. Conheço gente com 80 anos que dirige melhor que muito jovem de 30. Essa hora acontece quando os sentidos não mais são confiáveis e é aí que devemos intervir com um trabalho de esclarecimento e convencimento. Grato por expor sua opinião. Abraços
 
Carlos CC - Cachoeira do Sul / Rio Grande do Sul
postado em: 12/08/2008, 17:44:41
parabéns mário, mais um excelente texto seu, pena que nem todos se concientizam a parar na hora certa, oque as vezes acaba em tragédia. Abraços, e continue com os causos.
 
Artur - São Paulo / São Paulo
postado em: 12/08/2008, 19:44:55
Parabens pela matéria. Comigo aconteceu algo semelhante...O condutor era da FEB, isso mesmo, pracinha da força expedicionária brasileira!!!Felizmente, chegamos num acordo no local. Com relação a idade para pilotar, tenho um segurança que está com 75 anos, vem pro trabalho numa CG 82 que possui desde zero!!!Venha aqui falar pra ele que já passou da idade de pilotar...Risos!!!
 
Clodo & Glayds, Casal Motociclista
Campina Grande / Paraíba
postado em: 13/08/2008, 12:42:54
mário, Aqui em Campina Grande-PB, existe o Motociclista mais velho do País, é o TIO BEL, ele é do Motoclube Tropeiros da Borborema, viaja conosco, numa HAYABUSA e tem 92 anos de idade. ele nos diz que o segredo da juventude é um coquetel que ele mesmo faz e toma toda noite. É conhaque, vinho, mel, castanha e amendoim. tudo na proporção certa. o segredo é a proporção que ele não revela. ninguem sabe a hora de parar, principalmente quem ama velocidade, como agente. Parabéns por mais uma História.
 
Rosania - Curitiba / Paraná
postado em: 21/08/2008, 14:28:32
Oi Mario...Belo texto. Concordo com o que disse, aqui não é nem uma questão de idade, e sim bom senso de saber a hora em que o corpo já não responde de maneira apropriada. Eu, pessoalmente não cheguei a conhecer o Sr.Zanchi, mas pelo fato de trabalhar na empresa que ele ajudou a fazer, ouço muitas histórias a respeito dele.Valeu por mais uma grande aventura..Sua Fã.
 

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